
Tramontana, 2023/25
Maria Vaz & Marlon de Paula.
Vozes e Visagens: A Arte como Narradora das Histórias Imaginárias de Belo Horizonte
Nossos imaginários, as histórias contadas pela voz do povo, conhecidas como lendas urbanas, ou, antigamente, as chamadas histórias de trancoso, estão vivas em nossas memórias. De que maneira elas nos orientam para imaginarmos as histórias não oficiais contadas da cidade? Como as artes visuais, a fotografia e o audiovisual podem operar no agenciamento das fabulações imaginárias que circulam boca a boca na cidade de Belo Horizonte? Quando os artistas abordam as literaturas presentes na oralidade popular?
São histórias dos desejos de manifestação pública, protestos lembrados, dos lenços brancos balançando em uma caminhada contra a desconfiguração permanente de um bairro. A presença marcante de um dançarino, entidade encantada, que conta a história pública da importância de uma festa de uma juventude que fez de uma quadra seu lugar de memória. Das Rosas, as infâncias e as memórias das lavadeiras e das benzedeiras. As vivências noturnas de uma cidade no tempo presente, suas luzes e seus mistérios. Uma cidade iluminada à noite ainda guarda suas visagens?
A pesquisa dos artistas Maria Vaz e Marlon de Paula para a exposição Tramontana trata das histórias fantásticas que sobrevivem, se reinventam, se reelaboram, se inscrevem e se atualizam na grande Belo Horizonte. É o resultado de um trabalho longo, de mais de dois anos de escuta, um exercício poético de inventário das vozes da cidade, identificando os indícios de vivências de luta e resistência.
Apesar do progresso tecno-ilógico, e me refiro ao termo de Adélia Prado, Maria Vaz e Marlon de Paula demonstram, com as imagens criadas por ferramentas de trabalho analógicas, digitais e artificiais, que, apesar de tudo, as pessoas continuam insistindo em inventar jeitos criativos de viver na cidade, narrando seus medos, seus assombros, suas conquistas, suas derrotas, seus sonhos, suas fantasias, suas imaginações, em fantásticas poesias urbanas.
E, mais importante ainda, as artes, enquanto mediadoras na cultura, desempenham um papel essencial de transmissão, na construção de diálogos, performando, também, as nossas transformações. As imagens recriam no tempo presente, no aqui e agora, o meio que ajuda a repetir, uma vez e outra vez, tantas quantas forem necessárias e possíveis, fazendo da vivência uma narrativa elaborada da experiência comum que o povo oferece à cidade.
Carolina Ruoso












